Em defesa de Neguinho da Beija-Flor e contra o racismo

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Em defesa de Neguinho da Beija-Flor e contra o racismo
Neguinho da Beija-Flor completa 73 anos nesta quarta-feira, com cinco décadas dedicadas ao Carnaval do Rio de Janeiro por meio da própria voz. Um ícone da maior festa popular do Brasil (e uma das mais relevantes do mundo), Neguinho não escapa do racismo. Nem aos 73. Nem no dia do próprio aniversário. Por isso, a Beija-Flor de Nilópolis vem a público repudiar as recentes menções ao artista em redes sociais e programa de rádio.
Enquanto uma fala racista Nelson Piquet em relação a Louis Hamilton passou a circular na internet na última terça, usuários utilizaram erroneamente o nome de Neguinho da Beija-Flor para tentar amenizar a declaração do ex-piloto brasileiro (ele chamou o automobilista britânico de  “neguinho” no ano passado e, agora, se desculpou).
O mesmo foi feito na terça pela apresentadora Zoe Martínez, do “The Morning Show”, da Rádio Jovem Pan. Elevando o grau do equívoco cometido por internautas, a profissional disse ao vivo: “Então, o Neguinho da Beija-Flor também é, né? Racista. E olha que ele é negro, negro, assim… que na escuridão a gente só vê a gengiva”.
As frases de Zoe Martínez revoltam e causam repugnância em familiares e admiradores do aniversariante do dia. O sentimento é o mesmo na escola em que ele construiu a brilhante carreira, reconhecida nacional e internacionalmente. Ninguém tem licença para falar por Neguinho da Beija-Flor. Para presumir ou ironizar sua postura diante da intolerância. Para sugerir que ele tenha sido condescendente ao assumir uma identidade que resinifica um modo preconceituoso de falar. Para embasar essa falsa percepção a partir da aparência do cantor.
Em comum, esses usuários das ferramentas digitais e Zoe Martínez têm o desconhecimento quanto à trajetória de Neguinho da Beija-Flor e a origem de sua alcunha. O músico exerce potente atuação contra o racismo e sempre utilizou o espaço conquistado para batalhar pela inclusão de pessoas negras na sociedade brasileira. Além de incentivar jovens talentos negros a cantarem ao seu lado, Neguinho cruzou a Marquês de Sapucaí inúmeras vezes entoando versos referentes à cultura e às religiões afro, com brados de resistência e fortalecimento.
A ocasião mais recente em que essa postura ficou nítida foi na folia deste ano, em abril, quando coube a Neguinho a tarefa de cantar com maestria o samba-enredo “Empretecer o pensamento é ouvir a voz da Beija-Flor”. Uma mensagem antirracista que se mostra ainda mais necessária diante daqueles que utilizam o apelido do sambista para justificar uma fala racista, feita por uma figura de grande alcance midiático.
Aliás, Neguinho da Beija-Flor, antes de adotar o nome da agremiação, era chamado de Neguinho da Vala. Era nos buracos da favela, com esgoto corrente que ele, ainda criança, caçava rãs, muçuns e cascudos — daí o reconhecimento entre aqueles com quem convivia. Como Neguinho, muitas outras crianças pretas e pobres ainda se divertem da mesma maneira. Em Nilópolis, elas ao menos crescem ao som da voz do cantor e incentivadas pelo exemplo dele. Não é assim no restante do Brasil.
O nome de Neguinho da Beija-Flor tem motivos de sobra para ser lembrado. Mas nunca em defesa de comportamentos racistas, inaceitáveis e indefensáveis. Ainda mais em grandes veículos de comunicação, a partir de comunicadores que, em tese, deveriam agir com responsabilidade e respeito. Os internautas em questão e Zoe Martínez precisam rever suas atitudes e, no mínimo, se desculparem com Neguinho da Beija-Flor.
A ele, nossa escola deseja muito mais anos de vida, música, reconhecimento e luta.
*Crédito da foto: Eduardo Hollanda/ Divulgação

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